Uma lição importante sobre investimento é que, sempre que você ganha dinheiro, você deve se perguntar de onde ele veio. A razão para isso é entender se aquela fonte de receita é algo que realmente você pode confiar no longo prazo ou se foi apenas uma sorte ou ilusão passageira.
Nesse artigo, você entenderá:
- Como funciona um investimento;
- O mercado secundário de ações;
- O ouro;
- Opções;
- Vendas a descoberto;
- Pirâmides financeiras.
Como Funciona um Investimento
Um investimento acontece quando o investidor financia direta ou indiretamente a produção de algum bem ou serviço que será explorado comercialmente por uma empresa.
A produção de um bem ou serviço qualquer requer poupança e investimento. Sem poupança, não há como adquirir os bens de capital necessários para a produção. Porém, nem sempre as pessoas que possuem poupança são as mesmas que possuem projetos para produzir algum bem ou serviço. Há um grande número de poupadores, que não tem projetos, e um grande número de empreendedores que possuem projetos, mas não dispõem de recursos. O mercado de investimentos serve para unir essas duas categorias de pessoas.
Para entender esse conceito, pense em Lucas, que é um empreendedor que deseja abrir, por exemplo, um supermercado. Ele pode financiar seu empreendimento de três maneiras:
As duas últimas situações correspondem ao caso em que Lucas investe a poupança de terceiros. Portanto, nada mais justo do que pagar uma compensação futura aos investidores. Essa compensação futura é conhecida como retorno do investimento.
Com base no que é visto na Figura 2, podemos derivar todos os tipos de investimentos genuínos, isto é, aqueles voltados para a produção de bens e serviços:
- Renda Fixa: acontece quando o investidor empresta seus recursos ao empreendedor. Para isso, o investidor exige uma taxa de retorno combinada no momento da transação.
- Renda Variável: acontece quando o investidor adquire um título de propriedade sobre o resultado do investimento. Portanto, não há qualquer garantia de retorno na operação. Exemplos: ações e imóveis.
No caso da Renda Fixa, é muito comum que o investidor recorra a um intermediário, os bancos. A função dos bancos é facilitar o processo do investimento, reduzindo o risco de crédito. Em outras palavras, a grande maioria dos investidores é leiga e, assim, não terá condições de avaliar se o empreendedor será capaz de quitar seu empréstimo no futuro, o que é conhecido como solvência. Portanto, é mais saudável recorrer a um intermediário, como um banco, que é especialista em avaliar a solvência de um tomador de empréstimos.
No caso das ações, existem as Bolsas de Valores. Uma Bolsa de Valores é uma instituição que registra quem possui qual ativo. Dessa maneira, ela evita a necessidade de inúmeros contratos de transferência de propriedade. Além disso, cria um sistema simples para que a empresa tenha contato com seus acionistas espalhados por todo o país.
Quando o investimento é bem-sucedido, todos os envolvidos são beneficiados:
- O investidor ganha uma possibilidade de multiplicar seu patrimônio;
- O empreendedor ganha um financiamento para os seus produtos, o que lhe permite expandir seus negócios;
- A sociedade ganha mais produtos no mercado e terá uma opção adicional para escolher o produto que melhor lhe satisfaz.
Portanto, o investimento genuíno é o capitalismo em sua essência. Trata-se de uma relação voluntária, isto é, nenhum dos agentes foi obrigado a participar – todos participaram por livre e espontânea vontade – e mutuamente benéfica – é um jogo de ganha-ganha. As principais características que podemos destacar são:
- Voltado para a produção;
- Retornos lentos, que só ocorrem à medida que o produto lançado tem aceitação no mercado;
- Não há garantia real de retorno.
O economista John Maynard Keynes afirmou:
“Quando a Bolsa de Valores age como um cassino, o trabalho [do capitalismo] tende a ser mal feito.”
Essa frase é uma referência à verdadeira missão da Bolsa de Valores: prover capital fresco às empresas. A Bolsa de Valores facilita o investimento em ações e, portanto, promove um ambiente em que empresas podem obter capital e expandir seus negócios.
Os Objetivos do Investimento
Muitas vezes, as pessoas entram no mercado de investimentos com a ambição de ganhar muito dinheiro. Filmes, como o Lobo de Wall Street, reforçam o sonho de enriquecer acompanhando números.
Porém, eu sempre oriento que o principal objetivo do investimento é preservar o capital. Nunca deve ser ganhar dinheiro. Ganhar dinheiro é a consequência da preservação de capital a qualquer custo, como bem definiu o Professor da BM&F Bovespa André Machado.
E por que é necessário preservar seu capital?
- Se você deixar o seu dinheiro embaixo do colchão, seu poder de compra vai ser destruído pela inflação;
- Você nunca vai conseguir desfrutar de uma aposentadoria com dinheiro se não contar com rendimentos de aplicações financeiras.
Dito isso, o seu principal objetivo ao investir deve ser o de alcançar a independência financeira.
O Mercado Secundário
O mercado de ações tem duas divisões principais:
- Mercado Primário: quando as empresas lançam novas ações no mercado. O dinheiro recebido vai para o caixa delas. Esse movimento é conhecido como IPO ou Oferta Pública Inicial;
- Mercado Secundário: quando os investidores vendem suas ações para outros investidores.
O mercado secundário é muito maior que o mercado primário. No seu livro The Clash of Cultures , o célebre investidor John Bogle cita que as empresas absorvem $250 bilhões por ano em IPOs ou ofertas secundárias. Por outro lado, o volume total negociado nas Bolsas é de $33 trilhões, cerca de 130 vezes maior.
No Brasil, contamos nos dedos os IPOs dos últimos 5 anos. Diante disso, é natural pensar: o mercado de ações perdeu o seu propósito?
E a minha resposta é que não. O mercado secundário é tão importante quanto o primário.
Imagine que você é um investidor que está considerando comprar ações no IPO de uma determinada empresa. Você estaria disposto a investir se soubesse que será muito difícil vender as ações no futuro, caso precise do dinheiro ou mude sua estratégia de investimentos?
Se não houvesse o mercado secundário, muitas pessoas desistiriam de participar do mercado primário, pois não haveria uma saída simples.
Com frequência, esse problema acontece com fundos de private equity. Esses fundos adquirem empresas pequenas e depois procuram vendê-las a preços mais elevados no futuro. Não são raros os casos que eles têm dificuldades de sair de seus investimentos. Alguns exemplos estão aqui.
Um exemplo mais simples acontece caso você queira abrir uma empresa. Tente abrir uma empresa e vendê-la a um investidor. Eu lhe garanto que é bem mais difícil do que vender uma ação que você comprou na Bolsa.
Ouro: Proteção de Capital
Muitas pessoas, incluindo o próprio Keynes, ridicularizam o investimento em ouro, afirmando que o ouro não é um investimento. Diante da leitura desse artigo, alguns podem até pensar que, ao comprar ouro, você não financia a produção de bens e serviços de nenhuma forma.
Ao nos ater estritamente à definição dada por esse site, realmente o ouro não é um investimento.
Porém, isso não significa que ele deve ser desprezado. O ouro é um bem. O ouro é uma moeda, um meio de troca. Até a Conferência de Bretton-Woods, era a principal moeda a nível internacional. O dólar só valia alguma coisa porque uma nota de $100 podia ser trocada por 112 gramas de ouro a qualquer momento.
Como citado por Friedrich Hayek, Prêmio Nobel de Economia, em seu livro Desestatização do Dinheiro, a principal vantagem do ouro é que ele possui oferta limitada.
O preço de um bem é determinado pela sua oferta e demanda. No caso do papel moeda, a oferta pode ser aumentada a qualquer momento pelos bancos centrais, o que destrói o seu poder de compra. Porém, o mesmo não acontece com o ouro. Nenhum banco central tem o poder de desvalorizar o ouro que está em sua posse.
Por isso, o ouro é uma proteção de capital. O investimento em ouro parte do princípio de preservar o poder de compra.
Como exemplo, podemos citar o preço da carne, um dos alimentos que mais sofreram com a inflação desde o início do Plano Real em Julho de 1994.
O preço médio de um quilo de carne bovina passou de R$2,86 em Julho de 1994 para R$22,62 em Fevereiro de 2016. Enquanto isso, o preço do ouro passou de R$10,50 para R$154 no mesmo período. (Fonte: IEA/CATI – SAAESP)
Sendo assim, o poder de compra da grama de ouro passou de 3,7 para 6,8 quilos de carne bovina. Nada mal.
Quando se investe em ouro, é importante ter a consciência de que o investidor não busca o aumento patrimonial, mas a preservação do seu poder de compra.
Tendo em mente essa distinção, considere a inclusão de ouro e ativos semelhantes numa estratégia de diversificação para seus investimentos.
Opções
Uma opção é um direito de comprar (call) ou vender (put) um determinado ativo por um determinado preço. Para definir uma opção, são necessários dois investidores:
- Titular: paga pelo direito de exercer a compra ou venda do ativo;
- Lançador: recebe o prêmio da opção e assume o compromisso de comprar ou vender o ativo, caso o titular queira exercer a opção.
Uma put (opção de venda) funciona como um seguro de automóvel. Quando você faz um seguro de automóvel, você adquire o direito de comprar ou vender o seu carro à seguradora por um valor previamente acordado em caso de um sinistro com o veículo. Dessa maneira, você assume um prejuízo máximo em caso de um acidente com o seu carro.
Da mesma forma, ao comprar uma put, você salva o direito de vender a ação pelo preço combinado no contrato. Assim, caso a ação sofra um sério prejuízo, você será capaz de limitar seu prejuízo.
Esclarecido esse conceito, podemos entender a natureza das opções: são contratos entre duas pessoas. Uma opção não tem qualquer relação com a produção de bens e serviços para a sociedade.
Por isso, o mercado de opções é um jogo de soma zero. Sempre que você ganha dinheiro com opções, esse dinheiro veio de outros investidores. Sendo assim, você deve se achar genuinamente mais competente que os outros para tentar se aventurar nesse mercado.
Porém, há uma produção muito importante de um serviço dentro do mercado de investimentos: o lançador protege o titular de eventos desfavoráveis. Sendo assim, é interessante utilizar o mercado de opções de duas formas:
- Proteção (ou hedge): compre opções para limitar seus prejuízos com alguns ativos;
- Atuarial: aja como uma seguradora. Lance várias opções de vários ativos diferentes, de modo a garantir que, na média, você obterá lucro, mesmo que sofra alguns prejuízos – isto é, algumas opções sejam exercidas.
É um grande erro tratar opções como investimentos.
Como destacado pelo grande investidor Peter Lynch: do ponto de vista do titular, as opções têm uma data limite para serem exercidas. Passada essa data, elas viram pó, ou seja, não valem mais nada.
Vendas a Descoberto
Uma venda a descoberto consiste em vender um ativo que você não possui e recomprá-lo ao longo do dia esperando ganhar com a queda do ativo.
Por exemplo, suponha que você quer fazer uma venda a descoberto de PETR4. No começo do dia, a PETR4 vale R$5, então você vende por esse preço. Se, no final do dia, a PETR4 estiver valendo R$4, você vai recomprar o ativo por R$4, lucrando R$1.
Porém, se no final do dia, a PETR4 estiver valendo R$6, você vai ser obrigado a recomprar o ativo por R$6, sofrendo um prejuízo de R$1.
No caso das vendas a descoberto, também não há qualquer produção de bens e serviços nem mesmo no mercado de ações. Tudo o que se ganha vendendo a descoberto veio de outro investidor.
E mais, como bem destacou Peter Lynch:
“As perdas são virtualmente infinitas e você ainda pode perder muito dinheiro, mesmo estando certo”
Para entender o raciocínio de Lynch, suponha que você tentou vender PETR4 a descoberto pagando R$5 pelo ativo. Você fez uma séria análise e chegou à conclusão de que o ativo deveria valer R$3.
Porém, no curto prazo, o mercado pode se comportar de maneiras inesperadas. É possível que a PETR4 tenha uma valorização intensa devido a alguma notícia, mesmo que isso não faça o menor sentido dentro de sua análise. O resultado é que você vai perder muito dinheiro, mesmo estando certo.
Um dos maiores exemplos desse fenômeno são os títulos da dívida japonesa, como tratado pelo economista Fernando Ulrich.
Segundo Ulrich:
“Qualquer investidor sério que acompanhe a economia japonesa e as contas do governo chegará a uma conclusão óbvia: o governo nipônico está quebrado, e quando o restante do mercado se der conta, os juros dos bônus do governo irão para as alturas. Diante dessa constatação, nada mais natural que apostar contra os famosos JGB (japanese government bonds).”
Nota: quando os juros da dívida do governo caem, os preços dos títulos sobem. Os traders citados estão apostando no fenômeno contrário – os juros devem subir, e os preços dos títulos devem cair.
Podemos citar o déficit orçamentário na ordem de 8% do PIB e um endividamento de 230% do PIB. Diante disso, o governo japonês tem dados piores que o governo brasileiro, mas oferece seus títulos a juros negativos. E isso não faz nenhum sentido.
“O problema é que esse diagnóstico é válido há décadas e desde então os juros dos títulos de 10 anos do governo japonês vêm caindo sistematicamente. Quem tem apostado contra o governo do Japão está apanhando ano após ano”, destaca Ulrich.
Não se esqueça desse exemplo quando considerar fazer uma venda a descoberto. Traders de todo o mundo estão certos há mais de 10 anos a respeito dos títulos da dívida japonesa. Mesmo assim, continuam perdendo dinheiro.
É muito mais fácil prever o comportamento de uma boa empresa daqui a 10 ou 20 anos do que prever o comportamento de uma má nos próximos meses.
Pirâmides Financeiras
Quando estudava na faculdade, eu fiquei bastante triste de ver pessoas com um certo nível intelectual “investindo” em coisas do tipo Telexfree, que eram notadamente pirâmides financeiras.
Uma pirâmide financeira, também conhecida como Sistema Ponzi, é um sistema em que existe o beneficiário original, criador da pirâmide. Ele convence outras pessoas a entrar no esquema prometendo retornos extraordinários e guarda o dinheiro delas para si.
Para garantir o retorno extraordinário prometido à segunda classe da pirâmide, o administrador diz que eles devem procurar novas pessoas para ingressar no esquema, na terceira classe. Ele, então, repassa o dinheiro dessas pessoas para a segunda classe e recolhe uma parte desse dinheiro para a primeira classe. O retorno da terceira classe depende de novas pessoas entrando no esquema para formar uma quarta classe. E, assim, por diante.
Observe que as pessoas podem até ganhar dinheiro numa pirâmide financeira, porém esse dinheiro não vem da produção, mas sim de outras pessoas. Não se trata de uma relação mutuamente benéfica, pois fatalmente a pirâmide irá explodir e os últimos a entrarem nela perderão a maior parte de seu capital, pois não há novos entrantes para pagar suas despesas.
Em contraste ao investimento, as principais características de uma pirâmide financeira são:
- Não são voltadas para a produção;
- Prometem retornos rápidos.
Um caso curioso de pirâmide financeira que a maioria das pessoas investe é o INSS. Tudo o que você paga para o INSS é utilizado apenas para financiar os gastos do governo com os que já estão aposentados. Esse sistema é tratado com mais detalhes em outro artigo. Mas, de antemão, não confie cegamente na Previdência Social. Faça uma reserva. Invista.
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